Hoje vamos discorrer sobre mais um assunto muito cobrado nos concursos para veterinários: a brucelose. Nessa série de publicações do IFOPE, estamos compilando em um único texto todos os detalhes mais recorrentes em provas anteriores. 

Vamos descrever o agente etiológico, a patogenia e epidemiologia assim como os métodos diagnósticos da brucelose. Aproveite para fazer uma revisão pós-aulas do IFOPE, e treine seus conhecimentos nas questões que colocamos no texto.

Brucelose

A Brucelose é uma zoonose reemergente e cosmopolita.

Os sintomas principais estão relacionados a infecções crônicas e lesões em tecidos do sistema genital.

O gênero Brucella é classificado em espécies e a maioria é capaz de infectar vários hospedeiros mamíferos.

Agente Etiológico

O gênero Brucella compreende um grupo de bactérias cocobacilos gram-negativas, imóveis, aeróbicas e intracelulares facultativas que sobrevivem quase que exclusivamente nos hospedeiros infectados (não são comensais nem são encontradas em vida livre no ambiente).

São reconhecidas dez espécies de Brucella, sendo que cada espécie possui um hospedeiro preferencial e podem ser divididas em dois grupos antigenicamente distintos: as lisas e rugosas.

A Brucella abortus, B. suis, B. melitensis e B. neotomae apresentam colônias com morfologia lisa – uma característica associada à expressão de lipopolissacarídio (LPS) com porção antigênica cadeia lateral O e a porção tóxica lipídeo A.

Comparativamente, B. ovis e B. canis apresentam colônias com morfologia rugosa – nessas a molécula de LPS é incompleta e não apresentam o antígeno O.

As linhagens lisas sobrevivem e se replicam nos macrófagos de forma mais eficiente que as rugosas. Acredita-se que tal fato ocorra devido à presença do antígeno-O nas espécies lisas, o qual é descrito como um importante fator de virulência. 

Brucelose: Espécies de Brucella e hospedeiros preferenciais

Brucella abortus, B. melitensis, B. suis e B. canis são as espécies que possuem maior importância como agentes zoonóticos sendo a B. abortus a espécie mais difundida no mundo e associada à maioria dos casos de brucelose humana.

Outra espécie que sempre consta nas questões das provas é a B. melitensis: é a espécie mais virulenta para o humano e considerada exótica no Brasil.

A B. melitensis é considerada endêmica em algumas regiões da América do Sul, América Central, África, Ásia, Oriente Médio, e países da região do Mediterrâneo.

Patogenia e Epidemiologia da Brucelose

A transmissão de Brucella aos humanos ocorre por contato direto com animais infectados ou materiais associados ao aborto por meio da penetração de partículas de aerossóis contaminados nos tecidos do sistema respiratório, da ingestão de bactérias ou da penetração em lesões de pele.

Por esse motivo, a brucelose humana é caracterizada como uma doença ocupacional, mais frequente em trabalhadores rurais, veterinários, funcionários de abatedouros e laboratórios, mas a transmissão também pode ocorrer pelo consumo de produtos lácteos não pasteurizados. 

Em humanos, os sinais clínicos da brucelose não são patognomônicos e podem incluir:

  • pirexia (febre ondulante);
  • cefaleia;
  • dores articulares e musculares;
  • sudorese noturna;
  • e até manifestações neurológicas.

Nos animais a porta de entrada mais importante é o trato digestivo, sendo que a infecção se inicia quando um animal suscetível ingere água e alimentos contaminados ou pelo hábito de lamber as crias recém-nascidas.

Uma vaca pode adquirir a doença apenas por cheirar fetos abortados, pois a bactéria também pode entrar pelas mucosas do nariz e dos olhos.

A transmissão pelo coito não é considerada uma importante via de transmissão. Na monta natural, o sêmen é depositado na vagina, onde há defesas inespecíficas que dificultam o processo de infecção. Mas em alguns concursos já foi cobrado: é possível a transmissão pela inseminação artificial? E a resposta é: sim, é possível! Na inseminação artificial, o sêmen é introduzido diretamente no útero, permitindo infecção da fêmea com pequenas quantidades do agente, sendo por isso importante via de transmissão.

Um excelente material para quem vai prestar prova do MAPA ou de outros órgãos de defesa animal, é o Manual do PNCEBT disponível nesse link.

Nos animais, a manifestação clínica mais comum é:

  • a perda da função reprodutiva;
  • aborto no terço final de prenhez;
  • nascimento de crias fracas;
  • e infertilidade em machos e fêmeas.  

A Brucella atravessa as membranas mucosas e alcança os tecidos linfáticos que drenam o local de entrada. As bactérias podem se replicar e se propagar para demais tecidos e órgãos, por meio da linfa e do sangue.

Durante a fase de bacteremia ocorre a distribuição das bactérias pelos tecidos mamários e reprodutores nos quais os mecanismos para a eliminação da Brucella são severamente reduzidos. A alta concentração de eritritol, presente no útero gravídico, tecidos mamários e ósteo articulares e órgãos do sistema reprodutor masculino, é uma possibilidade da localização preferencial da B. abortus.

O tropismo pelo útero e placenta dos animais prenhes pode resultar em placentite necrótica e consequentemente ao aborto.

Com o desenvolvimento de imunidade celular após o primeiro aborto, há uma diminuição do número e do tamanho das lesões de placentomas nas gestações subsequentes. Com isso, o aborto torna-se infrequente, aparecendo outras manifestações da doença, como, por exemplo, a retenção de placenta, a natimortalidade ou o nascimento de bezerros fracos. Os machos podem apresentar orquite uni ou bilateral, o testículo pode apresentar um aspecto amolecido e cheio de pus. Lesões articulares também podem ser observadas.

A Brucella possui a capacidade em permanecer por longo tempo no interior de macrófagos, caracterizando a infecção crônica do agente.

Brucelose: epidemiologia

Resistência do Agente Etiológico

As bactérias do gênero Brucella possuem uma maior sobrevivência ambiental quando em condições úmidas e frias, com mínima exposição à luz solar.

A bactéria é suscetível à maioria dos desinfetantes para gram-negativas.

A pasteurização do leite é efetiva para matar a Brucella.

Observe os quadros abaixo sobre a resistência da Brucella sp no ambiente e a sensibilidade da B. abortus ao calor:

Resistência da Brucella sp no ambiente
Sensibilidade da B. abortus ao calor

Diagnóstico Laboratorial de Brucelose

O diagnóstico da brucelose pode ser realizado pelos métodos diretos (identificação do agente por isolamento bacteriano, PCR ou imunohistoquímica) ou por métodos indiretos (detecção de anticorpos através de sorologia).

Testes sorológicos 

Para a detecção de B. suis, B. abortus e B. melitensis o antígeno envolvido na resposta sorológica é a cadeia lateral O do LPS.

O componente estrutural da cadeia lateral O também é semelhante aos epítopos do LPS de outras bactérias, como Yersinia enterocolitica O:9 e Escherichia coli O:157, podendo ocasionar menor especificidade no diagnóstico.

Diagnóstico oficial

De acordo com o Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e da Tuberculose Animal (PNCEBT), o diagnóstico da Brucelose deve ser realizado através dos seguintes métodos:

1. Antígeno acidificado tamponado (AAT):

Muito sensível e de fácil execução, sendo o único teste de rotina realizado por médicos veterinários habilitados;

2. 2-mercaptoetanol (2-ME): 

É um teste confirmatório a que podem ser submetidos os animais que reagirem ao AAT.

O 2-ME desnatura a IgM através da destruição das pontes dissulfídricas. A molécula de IgM tem uma maior característica de aglutinação não específica que a molécula de IgG e, dessa forma, o emprego do 2-ME reduz o número de reações inespecíficas (atenção, já foi questão de prova!).

3. Fixação do complemento (FC):

É realizado para efeito de trânsito internacional e para diagnóstico de casos inconclusivos ao teste do 2-ME.

4. Polarização Fluorescente (FPA): 

É utilizado como teste único ou como teste confirmatório em animais reagentes ao AAT ou inconclusivo ao 2-ME;

5. Teste do Anel do Leite (TAL):

Utilizado para monitoramento das condições sanitárias de propriedades certificadas.

Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT)

O PNCEBT foi instituído pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA no ano 2000, sendo seu regulamento técnico revisto pela Instrução Normativa – IN nº 10, de 3/3/2017.

O programa tem por objetivo reduzir a prevalência e a incidência dessas doenças em bovinos e bubalinos, visando a erradicação. 

A estratégia de atuação do PNCEBT é baseada na classificação das Unidades da Federação quanto à condição sanitária de brucelose e tuberculose (grau de risco) e na definição de procedimentos de defesa sanitária animal a serem adotados de acordo com essa classificação. As medidas sanitárias preconizadas são compulsórias associadas a ações de adesão voluntária.

Ações compulsórias (obrigatórias):

  1. vacinação de bezerras entre 3 e 8 meses de idade contra Brucelose;
  2. controle de trânsito de animais;
  3. em focos: saneamento realizado pelo médico veterinário habilitado e fiscalizado pelo Serviço Veterinário Oficial (SVO).

Ações voluntárias:

  1. certificação da propriedade livre de brucelose.

Vacinação compulsória das bezerras

A vacina preconizada pelo PNCEBT é a B19 – vacina viva liofilizada, elaborada com amostra 19 de Brucella abortus

É facultada ao produtor a vacinação de fêmeas utilizando-se RB51 (vacina contra brucelose não indutora da formação de anticorpos aglutinantes), sob a responsabilidade técnica de médico veterinário cadastrado no SVO.

A vacina RB51 poderá substituir a vacina B19 em situações específicas:

  • propriedades certificadas livres de brucelose, a critério do produtor;
  • regiões onde as características geográficas restrinjam o manejo das explorações pecuárias a período limitado do ano, dificultando a vacinação contra brucelose das fêmeas até os 8 meses de idade;
  • Regularização da situação de bezerras não vacinadas entre 3 e 8 meses de idade com B19.

Não deixe de consultar as demais normativas sobre Brucelose, pois também são temas recorrentes nas provas dos órgãos de defesa sanitária estaduais e também do MAPA, o PNCEBT será um assunto para os próximos textos no blog do IFOPE.

IN 2, de 10 de janeiro de 2001Institui o PNCEBT
IN 10, de 3 de março de 2017 Aprova o regulamento técnico do PNCEBT
IN 30, de 7 de junho de 2006Estabelece normas para habilitação de médicos veterinário no PNCEBT
IN 34, de 9 de setembro de 2017Requisitos para diagnóstico de brucelose por laboratórios da Rede MAPA

Brucelose – Questões de Concursos:

Antes de prosseguir, que tal responder algumas questões já cobradas nas provas e que já foram explicadas no texto? 

1- (IF-RN, banca COMPERVE/2017 – Med. veterinário). A brucelose é uma antropozonose conhecida desde épocas remotas. A doença em bovinos é causada pela Brucella abortus. Em rebanhos afetados a brucelose pode resultar em diminuição da fertilidade, redução na produção de leite, abortamentos e degeneração testicular em touros. Sobre a brucelose bovina é correto afirmar:

(a) a infecção ocorre com maior frequência por contato venéreo, penetração em lesões de pele, inalação ou transmissão placentária.
(b) no tratamento de bovinos utilizam-se aminoglicosídeos, como a gentamicina associada à doxiciclina ou à minociclina, por quatro semanas.
(c) o teste do antígeno acidificado tamponado pode ser utilizado como teste de rotina no diagnóstico indireto dessa doença.
(d) como medida de controle, é obrigatória a vacinação de fêmeas com idade superior a oito meses, por atingir a maturidade sexual.

2- (ADAGRI/CE, banca CESPE/2009 – Agente Estadual Agropecuário). A brucelose, doença infectocontagiosa causada por bactérias, é transmitida pela urina, contato com a pele, sangue e ingestão de leite cru de vacas em processo de ordenha, sendo o diagnóstico feito por meio de exame de sangue.

(   ) CERTO
(   ) ERRADO

3- (ADRAGO, banca UPENET/2019 – Fiscal Estadual Agropecuário). No animal infectado pela brucelose, onde encontramos a bactéria com maior frequência?

1. Linfonodos, baço, fígado.
2. Aparelho reprodutor masculino, útero, úbere.
3. Rins, pulmão, útero.
4. Pulmão, fígado, úbere.
5. Linfonodos, rins, pulmão.

Está(ão) CORRETO(S), apenas, os itens:

  1. 1, 2 e 4, apenas.
  2. 1 e 2, apenas.
  3. 2, 3 e 5, apenas.
  4. 3,4 e 5, apenas.
  5. 1 e 3, apenas.

4- (MPE/SP, banca VUNESP/2016 – Analista técnico científico veterinário). No planejamento do programa sanitário de uma fazenda de criação de bovinos de corte, o profissional incluiu a imunização das bezerras fêmeas, com três a oito meses de idade, com a vacina contra a brucelose do tipo B-19. A justificativa para que a indicação da vacina inclua somente as fêmeas é que:

  1. apenas as fêmeas são suscetíveis.
  2. os machos não transmitem a infecção.
  3. a vacina pode causar orquites nos machos.
  4. a frequência de choques anafiláticos nos machos é muito alta.
  5. a vacina não é imunogênica para os machos.

Destinação de Carcaças e Órgãos na Linha de Abate

De acordo com o Decreto n° 9.013, de 29 de março de 2017 (o novo RIISPOA do MAPA), em seu Artigo 138, dispõe sobre as carcaças e os órgãos acometidos por Brucelose, devendo ser tomadas as seguintes medidas:

Animais com sorologia positiva para brucelose:

  • devem ser abatidos separadamente; 
  • as carcaças e órgãos devem ser encaminhados obrigatoriamente para o departamento de inspeção final (DIF);
  • os animais em estado febril no exame ante mortem deve-se condenar carcaças e órgãos;
  • carcaças com lesões localizadas devem ser destinadas ao aproveitamento condicional pelo uso do calor, depois de removidas e condenadas as áreas atingidas, incluindo úbere, trato genital e o sangue;
  • na ausência de lesões indicativas, as carcaças podem ser liberadas para consumo em natureza, devendo ser condenados o úbere, o trato genital e o sangue.

O tratamento pelo calor é descrito no RIISPOA em seu artigo 172 e envolve as seguintes medidas:

Brucelose - tratamento pelo calor

Notificação Obrigatória

De acordo com a IN N°50 de 24 de setembro de 2013 do MAPA, a Brucelose causada pela B. melitensis é considerada uma doença de múltiplas espécies, nunca registrada no país, que requer notificação imediata de caso suspeito ou em diagnóstico laboratorial.

Já a brucelose pela B. suis (múltiplas espécies) e B. abortus (bovinos e bubalinos) requer notificação imediata de qualquer caso confirmado.

Concurseiro, não deixe de estudar também o PNCEBT mais profundamente, logo mais também faremos um resumo sobre o assunto para finalizar o tema Brucelose!

Bons estudos e até a próxima publicação!

Leia também: Concursos: tudo que você precisa saber sobre o Complexo Teníase/Cisticercose

 Gabarito das questões:

  1. C
  2. CERTO
  3. B
  4. C 
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Autoria da redatora do Ifope:
Tereza Abujamra