Seguindo com os termos e conceitos de ameaças as quais a cadeia produtora e distribuidora de alimentos está susceptível, entramos na gestão de food defense ou defesa de alimentos, onde são abordadas as contaminações intencionais sem a finalidade de obter ganhos financeiros.

Quer saber mais sobre os procedimentos adotados no food defense? Então vem interagir com a gente!     

A Global Food Safety Initiative – GFSI define food defense como o processo para garantir a segurança de alimentos, ingredientes alimentares, ou embalagens de todas as formas de ataques maliciosos intencionais, incluindo ataques motivados ideologicamente, levando à contaminação ou a produtos inseguros.

Portanto, a motivação ou a causa raiz a ser tratada no food defense é a intenção de causar danos aos consumidores, ou às empresas.  Contexto que difere da motivação evidenciada no food fraud, onde a intenção envolve o ganho econômico. E que também distingue do food safety, em que não há intenção de causar danos, sendo as contaminações, quando ocorrem, acidentais.

Nesse cenário, os controles de riscos não intencionais do food safety, em sua maioria baseados na Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (HACCP), não têm a mesma relevância no food defense, e sua prevenção requer uma abordagem diferenciada. 

Os temas food safety e food fraud, suas definições e controles na indústria já foram abordados aqui no Blog do Ifope, acesse e fique por dentro de todos os detalhes que envolvem a gestão desses riscos.

Os controles food defense na indústria

O processo inicia com a condução de uma avaliação e identificação lógica das ameaças tentando responder a questões como: 

– Quem pode querer nos atacar? 
– Como eles podem fazer isso? 
– Qual é o potencial impacto na saúde pública? 
– Como podemos impedir que isso aconteça?

Os sistemas mais difundidos para condução da avaliação food defense são as Análises de Ameaças e Pontos Críticos de Controle – TACCP, recomendado pelo PAS96 e o CARVER + Shock, recomendado pela FDA.

PAS96

O PAS96, em sua versão mais atual: 2017, é um guia para proteger e defender alimentos e bebidas de ataques deliberados.

Publicado sob licença da British Standards Institution (BSI), o guia oferece orientações sobre como evitar e mitigar ameaças não apenas relacionadas à food defense, mas também à food fraud, e tem como metodologia de gerenciamento de riscos o TACCP.

TACCP

Similar ao HACCP, o TACCP preconiza o desenvolvimento de etapas que, em linhas gerais, seguem as seguintes orientações:  

  • identificação das ameaças cabíveis aos negócios da empresa, incluindo riscos externos como fornecedores, prestadores de serviço e clientes, e riscos internos como acessibilidade e colaboradores;
  • avaliação das ameaças potenciais considerando sua probabilidade de ocorrência versus impacto/consequência, em caso de ocorrência; 
  • implementação de medidas de mitigação dos riscos significativos, atividades de verificação, ações corretivas, responsabilidades e sistema de melhoria contínua;
  • documentação dos itens implementados em um Plano de Defesa de Alimentos, sendo esse plano apoiado pelo Sistema de Gerenciamento de Segurança de Alimentos da organização;
  • desenvolvimento de uma estratégia efetiva de treinamento e comunicação do Plano criado.

As ferramentas HACCP, TACCP e ainda VACCP são frequentemente citadas quando o assunto é segurança de alimentos. Para esclarecer a aplicação de cada uma de forma simples, a norma FSSC 22000 apresenta em seu guia para mitigação de fraude em alimentos o quadro com as principais diferenças entre os três conceitos.

Food defense
Fonte: Guia de Food Fraud FSSC 22000

CARVER + Shock

Trata-se de uma ferramenta ofensiva de priorização de metas adaptada para uso no setor de alimentos. Pensando como um invasor, avaliam-se as vulnerabilidades do sistema e identificam-se os alvos mais atraentes para o ataque com o objetivo de concentrar os recursos na proteção dos pontos mais vulneráveis.

Sua denominação indica os atributos usados para avaliar a atratividade do alvo ao ataque:

Criticidade – medida da saúde pública e dos impactos econômicos de um ataque.
Acessibilidade – capacidade de entrar e sair fisicamente do alvo.
Recuperabilidade – capacidade do sistema de se recuperar de um ataque.
Vulnerabilidade – facilidade de realizar ataques.
Efeito – quantidade de perda direta de um ataque, medida pela perda na produção.
Reconhecimento – facilidade de identificação do alvo.

Esses seis atributos, juntamente com o conceito Shock (que avalia o impacto de um ataque tanto na saúde, como na economia, e seu efeito psicológico) classificam, através de uma escala numérica, a atratividade do alvo entre menor e maior vulnerabilidade. Tal classificação permite que ações sejam planejadas para proteção dos pontos mais susceptíveis a ataques.

Estratégias de mitigação 

Após identificadas e avaliadas, as vulnerabilidades do sistema, as contaminações intencionais devem ser mitigadas através de ações de proteção dos setores internos e externos da produção do alimento. 

Outra ferramenta disponibilizada pela FDA, o Banco de Dados de Estratégias de Mitigação da Defesa de Alimentos (FDMSD), pode auxiliar na elaboração das estratégias de proteção trazendo soluções acessíveis, aplicadas às áreas de processo, armazenagem e distribuição, como, por exemplo:

  • restrição de acesso às imediações, equipamentos e operações apenas às pessoas autorizadas;
  • proibição do uso de itens pessoais nas áreas de processo, armazenamento e demais áreas restritas;
  • uso de sistemas de controle eletrônico de acesso, ou de alarme para áreas específicas;
  • uso de monitoramento por câmeras, ou por pessoas para observação visual de áreas específicas;
  • uso da identificação pessoal por uniformes e crachás para sinalização clara de pessoas autorizado em locais, equipamentos, controles e operações restritas;
  • condução periódica de checagem da integridade de embalagens de insumos e produtos acabados;
  • avaliação crítica de fornecedores, parceiros e prestadores de serviço;
  • aplicação de selos, embalagens secundárias e terciárias, e vedações para restringir o acesso ao produto;
  • uso de sistemas de acompanhamento da carga após expedição.

Toda a análise, ações e procedimentos devem ser direcionados pela equipe food defense, composto por colaboradores de áreas diversas, porém estratégicas, como RH, TI, Qualidade, Utilidades.

O sistema deve ser avaliado periodicamente através de auditorias internas e/ou auditorias externas de certificação do sistema de segurança de alimentos, uma vez que normas como a BRCGS, FSSC 22000 e a IFS incluem a temática food defense em seus requisitos. 

Se antecipar às ameaças de contaminação com intenção de causar danos ou por motivos ideológicos é um desafio corrente na rotina da cadeia de suprimento de alimentos.

Por envolver questões de cunho pessoal e comportamental, a chave para manutenção de um bom plano food defense é o conhecimento profundo não apenas dos processos, mas principalmente dos indivíduos envolvidos neles.

Conhecer, avaliar e entender intimamente fornecedores, parceiros, colaboradores, clientes, assim como as instalações, meios de transporte, insumos, perímetro, e as operações de monitoramento disponíveis trarão as informações necessárias, mas também a confiança desejada para garantir a qualidade e segurança dos alimentos fornecidos.  

[KIT] Como montar um RNC na Indústria de Alimentos

Autoria do redator do Ifope:
Tatiele Borges Pereira