Nessa série de publicações do IFOPE, iremos discorrer sobre as diferentes doenças cobradas nas provas de concursos veterinários. Baseados em questões de provas anteriores, condensamos tudo – ou quase tudo – sobre a Leishmaniose em um único texto, para facilitar seus estudos e saber o que é mais recorrente nas questões dos concursos.
Aproveite o texto para fazer uma revisão pós-aulas do IFOPE e ainda montar o seu mapa mental sobre a leishmaniose, assunto extremamente cobrado em provas. Bons estudos!
A Leishmaniose
O termo leishmaniose refere-se a um conjunto de enfermidades infecciosas, porém não contagiosas, de caráter zoonótico, causadas por protozoário.
Existem dois tipos de leishmaniose que são diferentes entre si, e podem provocar o comprometimento da pele, de mucosas e de vísceras, dependendo da espécie do parasita e da resposta imune do hospedeiro.
O agente etiológico tem comportamento dimórfico, ou seja, nos hospedeiros mamíferos, os parasitas assumem a forma amastigota (sem flagelo) e se multiplicam obrigatoriamente dentro de células do sistema fagocítico (especialmente macrófagos). Já nos vetores, a forma promastigota (flagelada) encontra –se no aparelho bucal e na luz do trato gastrointestinal, como podemos ver na figura 1.
O vetor da leishmaniose é um mosquito da subfamília Phlebotominae que possui atividade crepuscular/noturna, tamanho reduzido (2-3 mm) e corpo com pelos.
Seu ciclo de vida compreende as seguintes fases: ovo, larva, pupa e adultos, por isso são classificados como insetos holometábolos (metamorfose completa).
Os ovos são quase microscópicos, e uma vez eclodidos, geram larvas, que são de difícil visualização a olho nu e alimentam-se da matéria orgânica presente no solo.
Após um tempo, as larvas transformam-se em pupas, que se fixam no substrato e não se alimentam. Começa então a fase da metamorfose que resultará no inseto adulto.
Somente as fêmeas adultas são hematófagas, sendo o sangue um alimento importante para a maturação dos seus ovos.
A respeito da classificação zoonótica, de acordo com o sentido da transmissão, a leishmaniose pode ser classificada como uma antropozoonose, isto é, quando o agente se mantém nos animais e pode ser transmitido naturalmente ao homem.
Já de acordo com os ciclos de manutenção do agente etiológico, também é classificada como uma metazoonose (quando o agente precisa de um hospedeiro invertebrado para completar uma fase do seu ciclo biológico).
Leishmaniose tegumentar americana
Também conhecida como úlcera de Bauru, ferida brava e nariz de tapir.
Apresenta baixa mortalidade e pode se manifestar nas seguintes formas clínicas:
- Cutânea: caracterizada por uma úlcera cutânea com fundo granuloso e bordas infiltradas em moldura.
- Mucosa: caracterizada por uma ulceração na mucosa nasal com ou sem perfuração ou perda do septo nasal, podendo atingir os lábios, o palato e a nasofaringe
1- Espécies acometidas
Por ser uma zoonose, a leishmaniose afeta o ser humano e também os animais (cães, equinos, asininos, felídeos, roedores domésticos e sinantrópicos, preguiças, tamanduás, raposas e marsupiais).
2- Agente etiológico
Protozoários do gênero Leishmania: Leishmania (Leishmania) amazonenses, Leishmania (Viannia) guyanensi, Leishmania (Viannia) braziliensis, Leishmania (Viannia) lainsoni, Leishmania (Viannia) naiffi, Leishmania (Viannia) lindenberg e Leishmania (Viannia) shawi.
3- Vetores
Os insetos vetores são dípteros da subfamília Phlebotominae pertencentes aos gêneros Lutzomyia e Phlebotomus, conhecidos popularmente como mosquito-palha, tatuquira, birigui, asa dura, asa branca, cangalhada, cangalhinha, ligeirinho, péla-égua.
4- Transmissão
A leishmaniose tegumentar americana é transmitida pela picada das fêmeas dos mosquitos infectadas, não havendo transmissão direta.
5- Sintomatologia
A sintomatologia é semelhante tanto no ser humano quanto nos animais.
Na leishmaniose cutânea, o primeiro sintoma geralmente é um caroço bem definido no local da picada do mosquito. À medida que a infecção se espalha, mais caroços podem aparecer próximos ao caroço inicial. O caroço inicial aumenta lentamente e muitas vezes se torna uma ulceração aberta que pode expelir secreção ou formar uma crosta.
As ulcerações são geralmente indolores e não causam outros sintomas, a menos que uma infecção bacteriana se desenvolva nelas. As ulcerações acabam por se curar sozinhas depois de vários meses, mas podem persistir por mais de um ano. Elas deixam cicatrizes permanentes semelhantes às causadas por queimaduras.
Na leishmaniose mucosa, o primeiro sinal pode ser congestão nasal, secreção nasal ou hemorragias nasais, seguidos por uma ulceração cutânea e a destruição dos tecidos. Com o tempo, as pessoas e os animais podem ficar gravemente deformados.
6- Diagnóstico
O diagnóstico, tanto no homem como nos animais, é clínico, epidemiológico e laboratorial (parasitológico direto, teste intradérmico – intradermorreação de Montenegro, sorológico e molecular).
A confirmação laboratorial é fundamental, tendo em vista a necessidade de se realizar o diagnóstico diferencial para sífilis, hanseníase e tuberculose, por exemplo.
7- Tratamento
As drogas de primeira escolha no tratamento das leishmanioses são os antimoniais pentavalentes que, no Brasil, são representados pelo antimoniato de N-metilglucamina, administrado em doses diárias, intramusculares ou venosas, por 20 a 30 dias. As drogas de segunda escolha são a anfotericina B e o isotionato de pentamidina.
8- Prevenção e controle
A prevenção e o controle da leishmaniose tegumentar baseiam-se em três medidas:
– Vigilância epidemiológica
– Controle do vetor:
- fazer dedetização, quando indicada pelas autoridades de saúde;
- usar mosquiteiros para dormir;
- usar telas protetoras em janelas e portas;
- utilizar repelentes na pele quando estiver em áreas onde há a doença.
– Medidas educativas:
- educação da população a respeito da doença;
- estimular a coleta de lixo e a limpeza de terrenos;
- capacitação continuada dos profissionais de saúde.
Leishmaniose visceral
A leishmaniose visceral é popularmente conhecida como calazar (kala-azar), barriga d’água, febre dundun e doença do cachorro. É uma doença sistêmica, pois acomete vários órgãos internos (os parasitas se espalham da pele para os linfonodos, fígado, baço e medula óssea).
1- Espécies acometidas
Por ser uma zoonose, a leishmaniose afeta o ser humano e também os animais (cães, raposas e marsupiais).
2- Agente etiológico
Protozoários do gênero Leishmania: Leishmania (Leishmania) donovani, Leishmania (Leishmania) infantum e Leishmania (Leishmania) chagasi (responsável pela doença nas Américas).
3- Vetores
Os insetos vetores são dípteros da subfamília Phlebotominae das espécies Lutzomyia longipalpis e Lutzomyia cruzi.
4- Transmissão
A leishmaniose visceral é transmitida pela picada das fêmeas dos mosquitos infectadas, não havendo transmissão direta.
Os principais reservatórios da doença em áreas urbanas são os cães (Canis familiaris), enquanto as raposas e os marsupiais estão vinculados à manutenção do agente etiológico nos ambientes silvestres.
5- Sintomatologia
Nos animais: lesões cutâneas, descamações e eczemas no espelho nasal e orelhas. Nos estágios mais avançados pode ocorrer onicogrifose, esplenomegalia, linfoadenopatia, alopecia, dermatites, ceratoconjuntivite, coriza, apatia, diarreia, hemorragia intestinal, vômitos, edema de patas.
No homem a doença se desenvolve progressivamente e conforme a fase de evolução, pode ser dividida em:
- Período inicial: é a fase aguda, caracterizada pelo início do aparecimento dos sintomas (que pode variar de paciente para paciente), e inclui febre com duração inferior a quatro semanas, palidez cutaneomucosa e hepatoesplenomegalia.
- Período de estado: febre irregular, geralmente associada a emagrecimento progressivo, palidez cutaneomucosa e piora da hepatoesplenomegalia, com o comprometimento do estado geral.
- Período final: caso não sejam feitos o diagnóstico e tratamento adequados, a doença evolui progressivamente, com comprometimento mais intenso do estado geral, febre, desnutrição, edema dos membros inferiores (que pode evoluir para anasarca), hemorragias (epistaxe, gengivorragia e petéquias), icterícia e ascite. Nestes pacientes o óbito é determinado por infecções bacterianas oportunistas e/ou sangramentos.
6- Diagnóstico
O diagnóstico de leishmaniose visceral é semelhante no Homem e nos animais. Baseia-se no histórico clínico-epidemiológico e em exames laboratoriais, que incluem:
- Testes parasitológicos (demonstração de parasitas obtidos de punção de linfonodos, fígado, baço e/ou medula óssea corados por Giemsa)
- Testes sorológicos/imunológicos (pesquisa de anticorpos contra Leishmania por meio de imunofluorescência indireta – RIFI e ensaio imunoenzimático – ELISA).
É importante realizar o diagnóstico diferencial com enterobacteriose de curso prolongado (associação de esquistossomose com salmonela ou outra enterobactéria), malária, brucelose, febre tifoide, esquistossomose hepatoesplênica, forma aguda da doença de Chagas, linfoma, mieloma múltiplo, anemia falciforme, entre outras doenças.
7- Tratamento
As drogas utilizadas para o tratamento de leishmaniose visceral em humanos são o antimoniato de N-metilglucamina e a anfotericina B lipossomal (a anfotericina B é incorporada dentro de lipossomas feitos com fosfatidilcolina, colesterol e disterolfosfatidilglicerol, para atingir níveis plasmáticos mais elevados).
A leishmaniose visceral canina é mais resistente à terapia do que a humana, e a cura parasitológica é raramente obtida.
No Brasil, a Portaria Interministerial nº. 1.426, de 11 de julho de 2008, do Ministério da Saúde (MS) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) proíbe o tratamento de cães com a utilização de drogas da terapêutica humana ou não registrados no MAPA. Assim, somente os cães que estiverem em tratamento exclusivamente com o milteforan aprovado pelo MAPA não necessitarão ser encaminhados para eutanásia, desde que se cumpra o protocolo de tratamento descrito na rotulagem do produto e seja respeitada a necessidade de reavaliação clínica, laboratorial e parasitológica periódica pelo médico-veterinário.
8- Prevenção e controle
As principais medidas de prevenção e controle da leishmaniose visceral são:
- uso de mosquiteiro com malha fina para dormir e instalação de telas em portas e janelas;
- uso de repelentes quando estiver em áreas onde há a doença;
- diagnóstico e tratamento precoce dos casos humanos;
- atividades de educação em saúde;
- controle do vetor: limpeza urbana (eliminação e destino adequado dos resíduos sólidos orgânicos), eliminação de fontes de umidade, não permanência de animais domésticos dentro de casa;
- controle da população canina errante (castração de machos e fêmeas, e em casos de doação de animais, realizar exame sorológico para a doença antes da doação);
- uso de telas em canis;
- uso de coleiras impregnadas com deltametrina a 4% para afastar o vetor;
- eutanásia* de cães com sorologia positiva ou parasitológico positivo;
- vacinação** dos cães.
* A eutanásia de cães deve ser avaliada considerando-se os benefícios (impacto sobre a saúde pública) e prejuízos (impacto social) e deve basear-se na Resolução nº 1.000, de 11 de maio de 2012, do Conselho Federal de Medicina Veterinária, que dispõe sobre os procedimentos e métodos de eutanásia em animais.
**A vacina está indicada somente para animais assintomáticos com resultados sorológicos não reagentes para leishmaniose visceral. Cabe destacar que é uma vacina e não um imunoterápico, portanto, outras medidas devem ser adotadas, conforme normatização do Ministério da Saúde.
Agora que você já revisou o assunto, resolva algumas questões de provas anteriores para fixar o conhecimento e observar como as questões repetem sempre os mesmos detalhes sobre essa doença.
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Bons estudos e até a próxima publicação!
Autoria da redatora do Ifope:
Larissa Iyomasa
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