Um dos desafios continuamente enfrentados pelas indústrias de alimentos é garantir aos consumidores um produto livre de qualquer risco à saúde. Mesmo frente a esta situação, diversos profissionais da área preocupam-se em apenas realizar as análises microbiológicas exigidas por lei e se esquecem de algo essencial para conseguir evitar riscos maiores: a rastreabilidade no processo.

Neste artigo, você entenderá qual a importância de acrescentar a rastreabilidade na gestão de análises microbiológicas e como fazê-la. Acompanhe-nos até o final!

Segurança de Alimentos

O termo “Segurança de Alimentos”, também conhecido como Food Safety, é definido pelo Codex Alimentarius como a garantia de que os alimentos não causarão danos ao consumidor quando preparados e/ou consumidos de acordo com o uso a que se destinam. Para que essa ação seja cumprida pelas empresas é preciso fazer a adoção de práticas que visem controlar a ação de qualquer agente contaminante que entre em contato com o produto alimentício.

São três os tipos de perigos que um alimento inseguro pode conter:

  • Perigo físico – indicado pela presença de elementos estranhos, não pertencentes ao alimento, capazes de causar injúria ao consumidor. Exemplos: fragmentos sólidos de madeira, vidro, metal, plástico, pedras, etc.
  • Perigo químico – são contaminantes de natureza química, sintéticos ou naturais, cuja quantidade acima do limite aceitável pode prejudicar a saúde do consumidor. Exemplos: agentes sanitizantes, micotoxinas, resíduos agrotóxicos, substâncias alergênicas, etc.
  • Perigo biológico – constituem a presença de microrganismos como bactérias, fungos, vírus, protozoários e parasitas, capazes de causar alguma patogenia ao ser humano.

Os agentes deste último tipo de perigo, principalmente as bactérias, são os maiores responsáveis pelas Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA), sendo uma importante causa de morbidade e mortalidade no mundo. Quando duas ou mais pessoas apresentam sintomas parecidos ao ingerirem um alimento de mesma origem, isso já é considerado um surto de DTA. Para doenças de maior gravidade, como Botulismo, apenas 1 caso é o suficiente para ser declarado como surto.

A RDC nº 331/2019 é a resolução mais atualizada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) quando se trata de estabelecer padrões microbiológicos para garantir a segurança dos alimentos comercializados no país. Ela entrará em vigor oficialmente em dezembro de 2020 e a proximidade da data trouxe de volta a reflexão sobre o tema Gestão de Análises Microbiológicas, que para os profissionais da área é algo extremamente necessário.

Gestão de Análises Microbiológicas

Quando falamos sobre produção de alimentos, todo cuidado é pouco. Apenas um erro pode acabar afetando a saúde de dezenas, centenas e até milhares de pessoas, além de trazer enormes prejuízos financeiros para a empresa. Pensando nisso, dentre os parâmetros seguidos pelas indústrias do setor para averiguar a inocuidade e qualidade de seus produtos, os mais importantes são definidos pelas características microbiológicas.

Basicamente, a maioria das análises microbiológicas realizadas pelo setor alimentício focam em identificar e quantificar dois grupos específicos de microrganismos:

  • Deteriorantes – são microrganismos que causam alterações químicas indesejáveis nos alimentos, resultando na mudança de cor, sabor, odor e textura dos produtos. Normalmente, esse grupo não é responsável por transmitir doenças, já que dificilmente as pessoas consomem algo estragado.
  • Patogênicos – esses são os microrganismos mais perigosos, pois não alteram as características organolépticas dos alimentos e podem ocasionar sérias doenças quando ingeridos.

Possuir uma gestão eficiente das análises microbiológicas traz inúmeros benefícios para as empresas, dentre eles:

  • assegurar que os métodos de análises utilizados são eficazes;
  • diminuir os riscos de comercializar alimentos inseguros;
  • permitir uma ação corretiva rápida caso haja contaminação no processo.

Para que todos esses benefícios sejam obtidos em seu nível máximo não basta os profissionais da área preocuparem-se apenas com realizar as análises, é preciso se atentar a um aspecto ainda mais importante e pouco refletido sobre o tema: a rastreabilidade no processo.

Rastreabilidade na Gestão das Análises Microbiológicas

O termo rastreabilidade microbiológica pode ser definido como um controle de riscos microbiológicos que visa simplificar a identificação das possíveis etapas ou locais de contaminação, orientar o estabelecimento de limites aceitáveis e conduzir a implementação de medidas de monitoramento.

Priorizar essa ação possibilita inúmeras vantagens para as empresas, dentre elas:

  • adotar políticas específicas de qualidade;
  • otimizar os processos;
  • garantir a efetividade das Boas Práticas de Fabricação;
  • direcionar o treinamento higiênico-sanitário dos colaboradores para pontos específicos.

Mas como fazer a rastreabilidade no processo industrial? Confira a seguir os passos necessários.

#1 – Mapear o Processo Produtivo

Este passo é absolutamente indispensável para se obter um sistema de rastreamento microbiológico eficaz. Nele será possível estudar toda a sequência lógica das atividades de transformação, desde o recebimento da matéria-prima até a expedição do produto final.

O fluxograma ou diagrama de processos é uma das ferramentas mais utilizadas nesta fase por apresentar visualmente e de maneira “simples”, como cada atividade interage no processo ao longo do tempo.

#2 – Determinar os Pontos de Amostragem

Com o fluxograma finalizado é possível, agora, identificar todas as etapas críticas do processo, ou seja, aquelas operações ou atividades que, caso não seja estabelecido um controle de perigos, pode propiciar um risco de contaminação microbiológica ao produto. Uma dica para realizar este passo mais facilmente é utilizar a Árvore Decisória.

Nas etapas críticas será determinada a maioria dos pontos de amostragem, que são os

locais onde serão coletadas amostras tanto do produto quanto do ambiente de processamento que pode gerar uma contaminação direta ou indireta. Por exemplo: mãos do manipulador, superfície interna e/ou externa de equipamentos, paredes, pisos, ralos, ar do ambiente fechado, etc.

Nessa fase, é possível montar um mapa de rastreabilidade microbiológica contendo todos os pontos de amostragem previamente determinados para este controle. A imagem abaixo é um exemplo desse mapa para uma produção de cerveja, confira:

Mapa de análises microbiológicas
Fonte: Freire, 2013

#3 – Padronizar os Registros

Esqueça aquelas anotações rabiscadas em papel e sem nenhum padrão ou regularidade. Isso definitivamente não pode ocorrer!

As informações contidas nos registros são os itens mais importantes para possibilitar uma rastreabilidade microbiológica eficaz. Portanto, é preciso determinar quais serão os dados extraídos e de que forma isso ocorrerá.

Este passo se inicia no momento de coleta das amostras que devem ser devidamente identificadas tanto em etiqueta quanto em planilha eletrônica, contendo informações como:

  • data e horário de coleta;
  • nome da amostra;
  • local de amostragem.

Ao serem submetidas às análises microbiológicas, deve ser registrado em planilha não apenas os resultados pertinentes, mas também a data em que cada análise foi realizada, principalmente, se são terceirizadas por outra empresa.

Também é preciso estabelecer uma frequência e um responsável para coleta, verificação e monitoramento dos dados como forma de averiguar se as informações estão sendo obtidas adequadamente.

Resultados de uma Rastreabilidade Eficaz

Com a implantação da rastreabilidade das Análises microbiológicas no processo, é possível saber com maior precisão e rapidez em quais etapas ou locais estão havendo uma carga microbiana incomum e se esses microrganismos são carreados para etapas posteriores.

Se algum foco de contaminação for identificado, certas ferramentas da qualidade como o Diagrama de Ishikawa e os 5 Porquês podem ser utilizadas para achar a causa raiz do problema e finalmente solucioná-lo.

Tudo isso é possível fazer evitando os terríveis transtornos que decorrem quando há um surto de DTA causado por má gestão de análises microbiológicas. Portanto, você que já é ou deseja ingressar na área, faz muito bem em se informar melhor sobre este tema, não perca tempo e vá atrás de outros materiais que aprimorem ainda mais seu conhecimento!.

Autoria da redatora do Ifope:
Amanda Pereira Texeira