Os carrapatos são ectoparasitas muito comuns e podem transmitir diversas doenças para várias espécies animais. 

No texto de hoje veremos quais são as principais doenças transmitidas pelos carrapatos em cães, bovinos e equinos. Boa leitura!

Os carrapatos

Carrapatos são artrópodes pertencentes à classe Arachnida, isto é, possuem os apêndices articulados e exoesqueleto de quitina, apresentam quatro pares de patas e corpo dividido em cefalotórax e abdome. Suas peças bucais são modificadas (gnatossoma) apresentando dois pares de quelíceras e de palpos.

A fêmea adulta chega a depositar no ambiente mais de 3000 ovos de uma só vez. Dos ovos, eclodem as larvas, que irão se alimentar no hospedeiro e voltar para o ambiente, evoluindo para uma fase jovem chamada de ninfa, que também procura o hospedeiro para se alimentar e volta para o ambiente para se tornar adulto.

No ciclo monoxeno, é necessário somente um hospedeiro, enquanto no ciclo heteroxeno são necessários dois (ou mais) hospedeiros.

Os carrapatos são ectoparasitas de vertebrados, são hematófagos e podem transmitir diversos agentes patogênicos aos animais e aos seres humanos.

As doenças em cães são transmitidas pelo carrapato marrom (Rhipicephalus sanguineus), cuja espécie tem preferência por canídeos. 

O Rhipicephalus (Boophilus) microplus é um carrapato com preferência por bovinos, podendo acometer pequenos ruminantes e equídeos, entre outros mamíferos. Tem grande importância econômica, porque limita a pecuária no Brasil, tanto pela ação espoliativa e lesões no couro dos animais quanto pela transmissão de doenças. 

O Dermacentor nitens (antigo Anocentor nitens) é uma espécie de carrapato que se instala na orelha de equinos, acometendo o pavilhão auricular e causando sua “quebra”. É o principal transmissor da babesiose equina.

Já o Amblyomma cajennense, ou carrapato-estrela, é frequentemente encontrado em equinos, mas também pode parasitar bovinos, outros animais domésticos e animais silvestres, e é transmissor de zoonoses.

Tipos de carrapatos
Figura 1: carrapatos – 1. Rhipicephalus sanguineus, 2. Rhipicephalus (Boophilus) microplus, 3. Dermacentor nitens, 4. Amblyomma cajennense (Fonte: https://www.insectimages.org/)

Principais doenças transmitidas por carrapatos em cães

1. Babesiose

A babesiose canina é uma das mais importantes infecções que acomete os cães nas regiões tropical e subtropical do mundo.

Agente causador: 

Protozoários das espécies Babesia canis e Babesia gibsoni 

Transmissão:

Por transfusões sanguíneas ou pela picada do carrapato do cão, que inocula o protozoário no sangue do hospedeiro definitivo, onde ocorre a invasão dos glóbulos vermelhos.  

Patogenia:

Está relacionada à hemólise, causada pela multiplicação do parasita no interior das hemácias, com seu posterior rompimento. Com o rompimento das células parasitadas, além da anemia, ocorre liberação de hemoglobina, o que gera hemoglobinúria e bilirrubinemia, portanto, a doença se caracteriza por uma anemia hemolítica regenerativa

Sintomas:

– anorexia;
– apatia;
– febre;
– diarreia;
– icterícia.

Em alguns casos, pode haver o aparecimento de sintomas neurológicos, como:

– extrema apatia;
– agressividade;
– paralisia;
– ataxia.

Diagnóstico: 

Clínico (achados de anamnese e exame físico) e laboratorial, por:

– pesquisa do parasita em esfregaço sanguíneo;
– teste de ELISA;
– imunofluorescência indireta;
– PCR.

Profilaxia e tratamento: 

O principal erro dos tutores é procurar pelos carrapatos apenas no cachorro, pois a maior parte dos ovos, larvas e ninfas estão no ambiente, principalmente em locais frequentados por muitos animais. Assim, a melhor maneira de prevenir é mantendo os cães livres de carrapatos:

– desparasitar o ambiente;
– manter a grama do jardim baixa;
– realizar o controle do carrapato nos animais com o uso de produtos carrapaticidas (sprays, banhos e/ou coleiras).

O tratamento medicamentoso pode ser realizado com doxiciclina.

2. Erliquiose e anaplasmose

Embora sejam causadas por agente diferentes, a erliquiose e a anaplasmose, juntamente com a babesiose, são popularmente conhecidas como “doença do carrapato”, pois muitas vezes ocorrem concomitantemente.

Agente causador:

Rickettsias (Ehrlichia canis e Anaplasma platys)

Transmissão:

Por meio de vetores (sendo os carrapatos os mais importantes) e transfusões sanguíneas.

Sintomas:

Ehrlichia canis é um parasita intracelular obrigatório de leucócitos, enquanto que Anaplasma platys parasita as plaquetas (trombócitos). A sintomatologia é caracterizada por:

– febre;
– anorexia;
– apatia;
– depressão;
– vômitos;
– palidez de mucosas;
-comprometimento imunológico;
– glomerulonefrite pela deposição de imunocomplexos;
– sinais oculares (hifema, uveíte, cegueira, descolamento de retina);

Diagnóstico:

Clínico e laboratorial:

– hemograma: trombocitopenia, hipoalbuminemia, hiperglobulinemia;
– pesquisa dos parasitas em esfregaço sanguíneo;
– PCR;
– teste de ELISA.

Profilaxia e tratamento:

Controle dos carrapatos, tratamento de suporte, tetraciclina, doxiciclina.

* O Anaplasma phagocytophilum infecta os granulócitos e é o agente causador da anaplasmose granulocítica em cães, humanos e cavalos. Apesar de pouco comum no Brasil, infecções por A. phagocytophilum estão sendo documentadas em algumas regiões, sendo que a rickettsia é transmitida pelos carrapatos Rhipicephalus sanguineus e Amblyomma cajennense. Assim, por ser um agente zoonótico, ressalta-se a importância da identificação deste patógeno.

3. Hepatozoonose

É uma doença considerada rara no Brasil, e, apesar do nome, não é uma zoonose e raramente afeta o fígado.

Agente causador:

No Brasil a doença e causada por um hemoprotozoário da espécie Hepatozoon canis.

Transmissão:

Ingestão de carrapatos contendo oocistos maduros de H. canis.

Sintomas:

As manifestações clínicas dependem do nível de parasitemia podendo variar de mucosas pálidas e letargia até febre, severa perda de peso e esplenomegalia.

Diagnóstico:

Identificação de células leucocitárias parasitadas, em esfregaços sanguíneos. 

Profilaxia e tratamento:

Controle dos carrapatos, tratamento de suporte, cloranfenicol e a doxiciclina.

Principais doenças transmitidas por carrapatos em bovinos

1- Tristeza parasitária bovina (TPB)

É um complexo de doenças causadas pela rickettsia Anaplasma marginale e pelos protozoários Babesia bovis e Babesia bigemina. 

Animais debilitados por outros motivos, gado de raças europeias e bezerros são os mais susceptíveis. Alguns adultos podem ser assintomáticos.
A TPB traz prejuízos econômicos, como a redução da produção de leite e carne, infertilidade, gastos com tratamentos e mortalidade.

Transmissão:

A babesiose e a anaplasmose bovinas são hemoparasitoses transmitidas pela picada do carrapato Rhipicephalus (Boophilus) microplus, sendo que a anaplasmose pode ainda ser transmitida por dípteros hematófagos e fômites.

Sintomas:

A sintomatologia da TPB inclui:

– apatia e prostração;
– febre alta;
– mucosas pálidas.

São diferenciais os achados:

Babesia bovis: sintomatologia nervosa (ataxia, tremores e agressividade);
Babesia bigemina: hemoglobinúria por hemólise intravascular;
Anaplasma marginale: icterícia 

Diagnóstico:

Clínico e laboratorial. Apesar de ser possível determinar qual o parasita que está infestando o animal, na rotina de uma fazenda não há necessidade desse diagnóstico. 

Profilaxia e tratamento:

A prevenção pode ser feita por meio do controle estratégico de carrapatos e também através da imunização de animais passíveis de adoecer, com a utilização de um dos três métodos: 

1. Premunição – inoculação de sangue infectado com os agentes da TPB, retirado de um bovino portador. É um processo que pode gerar bons resultados, porém, com grande risco de perda por morte do animal ou por falha na imunização 

2. Vacinas atenuadas – inoculação de sangue infectado padronizado, assim, como os parasitas não apresentam sua virulência normal, haverá o desenvolvimento de uma infecção subclínica, que não requer tratamento e que leva ao desenvolvimento da imunidade nos animais. 

3. Quimioprofilaxia – utilização do dipropionato de imidocarb nos animais e a subsequente exposição à infestação pelo carrapato de maneira constante. A queda gradual dos níveis sanguíneos da droga permite um aumento gradual dos agentes da TPB nos bovinos, o que leva ao desenvolvimento da resposta imune. Porém, é necessário garantir uma infestação baixa e constante de carrapatos logo após a utilização da droga. 

O tratamento específico para babesiose constitui-se nos derivados da diamidina e para a anaplasmose recomenda-se o uso das tetraciclinas, enquanto que o dipropionato de imidocarb tem ação nas duas doenças. Geralmente, o tratamento específico aplicado antes do aparecimento de sintomas graves leva à recuperação do quadro clínico. Caso contrário, deve ser realizado também o tratamento de suporte (transfusões sanguíneas, fluidoterapia, etc.).

Principais doenças transmitidas por carrapatos em equinos

1. Babesiose 

Também conhecida como nutaliose, piroplasmose ou febre biliar, é uma enfermidade que acomete cavalos, asnos, mulas e zebras.

As barreiras sanitárias são o maior entrave para a aceitação dos equinos brasileiros no exterior, por conta de não existir um controle efetivo da babesiose no País.

Agente causador:

Protozoário Babesia caballi

Transmissão:

Pela picada de carrapatos, em especial Dermacentor nitens 

Sintomatologia:

Na fase aguda: 

– febre;
– icterícia;
– anemia;
– hepatoesplenomegalia;
– reabsorções embrionárias;
– abortos.

Na fase final:

– bilirrubinúria;
– hemoglobinúria.

A maioria dos animais desenvolve a forma crônica, que pode reagudizar quando ocorre queda na imunidade, podendo apresentar:

– queda de performance;
– inapetência;
– perda de peso.

Diagnóstico:

Identificação do agente através de esfregaço sanguíneo. A Organização Mundial da Saúde Animal preconiza o teste de imunofluorescência indireta e o de fixação de complemento para triagem dos casos em animais que serão destinados à exportação para países onde a doença não ocorre, mas existe a presença do vetor.

Profilaxia e tratamento:

Controle dos carrapatos e uso do medicamento dipropionato de imidocarb.

2. Theileriose

O termo theileriose equina é recente e surgiu devido à reclassificação taxonômica do protozoário Babesia equi, que passou a se chamar Theileria equi devido às diferenças morfológicas e em seu ciclo de vida quando comparado a outros membros da família Babesiidae.

Agente causador:

Protozoário intraeritrocitário Theileria equi

Transmissão:

Pela picada de carrapatos

Sintomatologia:

– febre;
– anemia hemolítica intravascular;
– hemoglobinúria;
– insuficiência renal;
– hepatoesplenomegalia;
– morte embrionária, abortamento ou o nascimento de um potro com theileriose neonatal.

A profilaxia e o tratamento são muito semelhantes aos da babesiose. Entretanto, salienta-se que o teste de imunofluorescência indireta é realizado para diferenciar as infecções por T. equi e B. caballi

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Autoria da redatora do Ifope:
Larissa Iyomasa