Se você trabalha com Produtos de Origem Animal (POA) ou está se preparando para concursos públicos veterinários, precisa ler este artigo e ficar por dentro desse tema polêmico: o selo ARTE, que altera a fiscalização e inspeção dos POA artesanais.

Entenda a nova lei 13.680/2018 e as mudanças que ela propõe. Conheça o posicionamento do MAPA e dos outros órgãos envolvidos, o impacto disso para os produtores e a população e ainda fique por dentro dos pontos positivos e negativos dessa legislação.

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A ação da vigilância sanitária no Rock in Rio

Os produtos alimentícios artesanais vêm sendo produzidos e negociados há bastante tempo.

Contudo, ganharam grande notoriedade após uma polêmica em torno de sua comercialização interestadual durante o Rock in Rio de 2017, quando uma grande quantidade de alimentos foi apreendida pela fiscalização no estande da chef Roberta Sudbrack.

Queijos e embutidos, de origem artesanal, fabricados fora do estado do Rio de Janeiro tiveram sua apreensão justificada por não estarem sendo comercializados de forma legal.

Nas redes sociais, Sudbrack lamentou suas perdas e criticou as regras de fiscalização em relação aos pequenos produtores, recebendo inúmeras manifestações, não só de apoio, mas também muitas críticas.

Inflamado o debate, um projeto de lei de 2015 acabou sendo aprovado no ano passado pelo Plenário, a lei do selo ARTE.

Conhecendo o selo ARTE

Nesse contexto, a Lei 13.680, de 14 de junho 2018 sancionada pelo ex-presidente Michel Temer garante a comercialização interestadual de produtos alimentícios de origem animal confeccionados artesanalmente, como queijos, linguiças e salames.

Ela altera a legislação anterior (Lei 1.283, de 18 de dezembro de 1950), que determinava que os produtos artesanais de origem animal só podiam ser comercializados fora do estado em que foram produzidos caso tivessem o selo do SIF (Serviço de Inspeção Federal) do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).

Assim, a antiga lei passa a vigorar, dentre outras atualizações, acrescida do artigo 10-A.

Este artigo tem como objetivo implementar a utilização de um selo com a inscrição “ARTE”: um selo que permite a comercialização desses tipos de produtos em todo o território nacional, após a supervisão dos órgãos de saúde pública de seu estado de origem.

Selo ARTE - SIF

Além disso, a inspeção e a fiscalização da elaboração dos produtos artesanais com o selo arte terão natureza prioritariamente orientadoras, com critério de dupla visita para a lavratura dos autos de infração.

Entretanto, a referida lei pode dar margem para que haja a interpretação de que foi retirada do MAPA a responsabilidade da fiscalização dos produtos artesanais de origem animal.

Posicionamento dos órgãos competentes

Em nota técnica, MAPA e ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) manifestaram-se contrários ao até então projeto de lei.

O Ministério ainda destacou que: “a avaliação do processo de elaboração de produtos de origem animal é de responsabilidade histórica dos órgãos de agricultura, devendo ainda ser executada por profissionais com formação em medicina veterinária”.

Nesse sentido, a CONTHA/CFMV (Comissão Nacional de Tecnologia e Higiene Alimentar do Conselho Federal de Medicina Veterinária) divulgou uma nota em que repudia a nova legislação e destaca que o interesse simplesmente econômico não pode se sobrepor à saúde da população.

A opinião dos fabricantes de POA sobre o selo ARTE

Em contrapartida, a criação do selo ARTE representa um relevante ganho para os pequenos produtores.

A noca lei favorece a descentralização e a desburocratização da fiscalização, além de apresentar outras vantagens, como:

  • o aumento nas vendas e na credibilidade da empresa;
  • produtos com maior valor agregado;
  • e combate ao comércio de produtos clandestinos.

De acordo com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), este selo traz benefícios econômicos, pois as pequenas agroindústrias artesanais de alimentos têm propiciado significativo incremento na renda de famílias rurais, em decorrência da crescente demanda por produtos alimentícios diferenciados e com tradição histórica.

Segundo a diretora técnica no exercício da presidência do Sebrae, Heloisa Menezes, “os pequenos produtores se fortalecem e os órgãos de fiscalização se mantêm mais próximos, facilitando a comercialização de produtos de qualidade, que observam as normas sanitárias”.

Já para Paulo Gontijo, presidente do Livres, um movimento liberal suprapartidário, a sanção da nova lei, que cria o selo ARTE, representa uma vitória do empreendedorismo no país.

O que se espera agora

De fato, esse é um modelo que deu certo na Europa.

Porém, tomando como exemplo a indústria de laticínios, o padrão microbiológico do leite cru europeu é bem superior ao brasileiro, o que possibilita, nesses países, a produção de queijos a partir de leite não pasteurizado com baixos riscos à saúde pública.

Nesse contexto, é importante que as novas Instruções Normativas para o leite (IN 76 e IN 77) sejam obedecidas. Ademais, agora espera-se que haja a criação de outras políticas públicas e programas de capacitação para os pequenos negócios rurais, além da conscientização dos mesmos, como forma de diminuir e/ou prevenir riscos, colocando no mercado produtos de qualidade.

Dessa forma, como estava faltando um decreto que regulamentasse a nova lei, em meados de 2019 foram aprovados o decreto nº 9.918, de 18 de julho de 2019 e a Instrução Normativa MAPA n° 28 de 23 de julho de 2019, que, entre outras recomendações, especificam que:

  • produtos alimentícios de origem animal produzidos de forma artesanal são produtos comestíveis elaborados com predominância de matérias-primas de origem animal de produção própria ou de origem determinada, resultantes de técnicas predominantemente manuais adotadas por indivíduo que detenha o domínio integral do processo produtivo, submetidos ao controle do serviço de inspeção oficial, cujo produto final de fabrico é individualizado, genuíno e mantém a singularidade e as características tradicionais, culturais ou regionais do produto;
  • os produtos alimentícios de origem animal produzidos de forma artesanal, além do selo do serviço de inspeção oficial, serão identificados por selo único com a indicação ARTE;
  • os produtos alimentícios de origem animal produzidos de forma artesanal que receberem o selo ARTE serão reconhecidos e comercializados no território nacional;
  • a concessão de selo ARTE é ato de competência dos órgãos de agricultura e pecuária estaduais e distrital que reconhece e caracteriza o tipo de produto alimentício artesanal conforme características de identidade e qualidade específicas e o seu processo produtivo tipicamente artesanal;
  • compete ao MAPA (entre outras atribuições dispostas nesta lei) estabelecer, em normas técnicas complementares, as boas práticas agropecuárias na produção artesanal e na fabricação de produtos artesanais da carne e seus derivados, do pescado e seus derivados, dos ovos e seus derivados, do leite e seus derivados e dos produtos de abelhas e seus derivados, necessárias à concessão do selo ARTE.

Deste modo, com todas as regulamentações em vigor, a primeira etapa da aplicação do selo ARTE será para produtos lácteos, especialmente queijos. As próximas etapas devem abranger produtos cárneos, produtos de pescados e produtos oriundos de abelhas.

Além disso, a fim de esclarecer melhor aos produtores, aos profissionais da área de alimentos e à população em geral, o MAPA disponibilizou em seu site um manual do selo arte e perguntas e respostas sobre o selo ARTE.

Portanto, neste momento torna-se fundamental, por parte de todos os setores envolvidos, a adequação à nova legislação, além da participação e da fiscalização dos desdobramentos desta nova lei.

Autoria da redatora do Ifope:
Larissa Iyomasa

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