No campo da segurança alimentar, têm-se discutido muito sobre Food Defense e Food Fraud. Isso porque esses temas são de alta relevância tanto para a credibilidade de empresas do setor, quanto para a saúde pública e segurança dos consumidores. Além disso, eles foram incluídos na ISO 22000:2018, que substitui a ISO 22000:2005, o que levantou ainda mais as discussões sobre o tema e novos tratamentos para essas questões. 

E o que é a ISO 22000? O que é Food Fraud? Como esses termos influenciam a vida do consumidor? O que o profissional que atua na área de segurança alimentar precisa saber sobre esse tema? Continue lendo e confira as respostas para todas essas questões.

O que é a Iso  22000?

Iso 22000 trata-se de uma norma que compõe a base da FSSC 22000, uma norma internacionalmente aceita para avaliação e certificação do sistema de gestão da segurança de alimentos em toda cadeia alimentar, contribuindo para a adequação dos requisitos em um nível global. Assim, serve para impedir as fraudes de alimentos em todo o mundo. 

Empresas que possuem essa certificação, fabricam produtos com maior qualidade e seguros ao consumo, sendo referências no mercado, atendendo os clientes mais exigentes. Isso porque as normas são rígidas, assim como a fiscalização e controle de qualidade. 

Leia também: Diferença entre as principais normas ISO aplicáveis às indústrias de alimentos

É relevante entender, que essa norma se mantém sempre atualizada, conforme as necessidades do segmento alimentício. Afinal, toda indústria está constantemente se reinventando para manter-se competitiva no mercado e sempre oferecer o melhores para seus clientes. 

Na atualidade, surgiu a necessidade de se incluir a importância do Food Fraud e Food Defense, nos programas de autocontrole das empresas, com a intenção de propor ações que mitiguem possíveis fraudes intencionais a que os alimentos estão sujeitos.

O que é Food Fraud?

Segundo a FSSC 22000 (Food Safety Sistem Certification), que inclui a Iso 22000, “Food Fraud é o termo coletivo que abrange a substituição intencional, adição, adulteração ou falsificação de alimentos, ingredientes alimentícios, embalagens alimentícias, rotulagem, informações sobre produtos ou declarações falsas/ enganosas feitas sobre um produto, visando ganho econômico e que podem causar impacto à saúde do consumidor” (GFSIBR v7:2017).

De acordo com a mesma norma, os riscos relacionados às fraudes nos alimentos, para o consumidor, podem se apresentar de três maneiras: 

  1. Risco direto à segurança dos alimentos: é quando o consumidor é colocado em risco imediato por falha da empresa fornecedora do produto. Ex: ocultação intencional de substâncias alergênicas nas embalagens, que pode causar uma reação alérgica imediata e levar à morte. 
  2. Riscos indiretos da segurança de alimentos: é quando o consumidor é colocado em risco intencionalmente por exposição a longo prazo. Ex: adição de metais pesados em suplementos, que podem causar uma série de problemas à saúde humana, inclusive neurológicos. 
  3. Risco técnico de fraude em alimentos: não há riscos de segurança alimentar diretos ou indiretos. Porém, a rastreabilidade do produto é comprometida, impedindo a empresa de garantir a segurança dos seus produtos em todo o processo. Ex: adulteração de informações da empresa, dos modos de produção e distribuição, etc. 

Apesar de ter sido incluído recentemente em referências da área, a fraude de alimentos é uma prática bem antiga. Exemplos de fraudes com pesos e medidas de alimentos já existem desde a Idade Média e, com o avanço da tecnologia, essas ocorrências também evoluíram, ficando cada vez mais difíceis de serem identificadas.  

Leia também: Conheça os tipos de auditoria mais comuns na indústria de alimentos

Exemplo de Food Fraud

Em 2013, ocorreu o maior caso de fraude nos alimentos no mundo, conhecido como escândalo da carne de cavalo.  Na Europa, a carne bovina foi misturada com a carne de cavalo e vendida com o mesmo valor, mesmo a carne de cavalo sendo mais barata. Produtos congelados que continham carne de boi, também foram adulterados. 

Essa fraude, assombrou os consumidores europeus e levou os supermercados a retirarem milhares de produtos congelados das prateleiras. Mesmo que a carne de cavalo não apresente risco à saúde, a confiança dos consumidores ficou abalada e os prejuízos para as empresas foram imensos. 

De fato, é inaceitável que a carne de cavalo seja aprovada como sendo bovina. O que está escrito em um rótulo deve estar de acordo com o que está no produto, não é mesmo?

De acordo com a IFS (International Featured Standard) estima-se que a fraude nos alimentos custam às indústrias alimentícias, mundialmente, cerca de US$20 a US$50 bilhões por ano. 

Impactos da Food Fraud

No geral, a Food Fraud sempre acontece com objetivo de diminuir os custos de produção por parte da empresa, gerando mais lucro no processo final. No entanto, os custos com as consequências deste ato são tão grandes, que não compensa. 

É muito dinheiro perdido! E não para por aí… São vastos os impactos econômicos para as empresas, como, por exemplo:  

  • necessidade de sistema de recall eficiente – a retirada de produtos do comércio demanda gastos e deve ser realizada rapidamente para evitar que o produto chegue impróprio ao consumidor, causando mais revolta e mais prejuízos;
  • custos para a reconstrução da reputação – uma vez afetada, a empresa gastará com revisão de todo o processo de produção, revisão de funcionários, propagandas e divulgações e até mesmo criação de uma nova marca e identidade;
  • redução de vendas – como se não bastasse, além de todos esses gastos citados, a empresa ainda terá que se reinventar, uma vez que os produtos não serão vendidos como antes e o consumidor ainda estará desconfiado sobre a integridade da marca. 

O que é Food Defense?

Food Defense também é um tipo de fraude alimentar, porém o que a diferencia da Food Fraud, é a motivação com que ela é realizada. Enquanto  relacionamos a food fraud à motivações financeiras, a food defense é focada nas motivações ideológicas, ou seja, funcionários descontentes, grupos contrários, etc.

O Plano de food defense representa o esforço para proteger os alimentos de atos de adulteração intencional ideológica. Em maio de 2016, o FDA (Food and Drug Administration) emitiu a regra final sobre Estratégias de Mitigação para Proteger Alimentos Contra Adulteração Intencional com requisitos para instalações cobertas para preparar e implementar planos de defesa alimentar.

Instituições que trabalham com Food Defense

A FDA trabalha com o setor privado e outras agências governamentais em atividades relacionadas à defesa alimentar, incluindo a realização de pesquisas e análises, desenvolvimento e fornecimento de treinamento e divulgação e realização de exercícios. Além disso, a FDA desenvolveu uma série de ferramentas e recursos para ajudar os estabelecimentos de alimentação a prevenir, preparar, responder e se recuperar de atos de adulteração intencional do suprimento de alimentos.

No entanto, a FDA é apenas uma das muitas instituições que trabalham com o objetivo da proteção alimentar. Como outros exemplos, podemos citar o GFSI (Iniciativa Global de Inocuidade de Alimentos), o PAS (Publicly Available Specification) e até mesmo a FSSC 22000, que já citamos por aqui. 

Existem diversas normas que ajudam a regular esse tipo de prática, e você pode observar que muitas delas são internacionais. Assim, elas realmente devem ter um alcance de nível global, uma vez que a globalização impulsionou e criou uma lógica de mercado de alto fluxo de importações e exportações de alimentos. 

Tipos de fraudes em alimentos

As fraudes em alimentos podem ocorrer por diversas formas, como, adulteração, falsificação, alterações em fórmulas, ocultação, rotulagem incorreta. Todas elas objetivam aumentar o lucro dos fabricantes uma vez que atribui ao produto, características que não possuem, normalmente utilizando um material mais barato do que deveriam. 

Todos os tipos de alimentos estão sujeitos à fraude e adulterações. Porém, existem aqueles que são mais comuns de serem falsificados, pela facilidade, alto custo de produção, dentre diversos outros fatores. O Guia de Food Fraud, publicado pela FSS 22000, em maio de 2019, descreve as principais fraudes nos alimentos e seus exemplos. Confira agora quais são elas. 

Fraudes por Diluição

É quando um ingrediente líquido de alto valor é misturado com outro ingrediente líquido, de baixo valor.

Ex: produtos diluídos usando água não potável, azeite de oliva diluído com óleo potencialmente tóxico de malaleuca ou tea tree.

Fraudes por Substituição

É o processo de substituição de um ingrediente de alto valor por outro ingrediente de baixo valor.

Ex: óleo de girassol parcialmente substituído por óleo mineral, proteína de couro hidrolisada no leite.

Fraudes por Ocultação

É quando se esconde ou oculta a baixa qualidade de um ingrediente ou produto alimentício.

Ex: pigmentos nocivos aplicados a frutas frescas para cobrir defeitos.

Fraudes por Melhorias não Autorizadas 

Trata-se do processo de se adicionar materiais desconhecidos a produtos alimentícios, de modo a melhorar a qualidade.

Ex: melanina adicionada ao leite para aumentar o seu valor proteico, uso de aditivos não autorizados em alimentos.

Fraudes por Rotulagem incorreta

Refere-se quando existe inclusão de falsas informações nas embalagens de produtos, com fins de ganho econômico.

Ex: validade incorreta, valor nutritivo incorreta.

Fraudes por Falsificação

É quando é copiado o nome da marca, conceito, embalagem, receita ou método de processamento, de produtos alimentícios.

Ex: barras de chocolate falsificadas, cópias de alimentos populares produzidos sem a garantia da segurança alimentar.

Fraudes por roubo ou desvio

Esse é um caso especial, e está fora da SSAFE (Seguro Protegido e Alimento Seguro para Todos), pois relaciona a venda de produtos não declarados.

Ex: produto alocado para o EUA, aparecendo na Coreia.

Leia também: O que é a ficha técnica de alimentos, quando e como é utilizada. 

Concluindo

Podemos notar que os fraudadores são muito criativos e adaptáveis a várias situações.

A evolução da tecnologia implicou diretamente no aperfeiçoamento das fraudes, tornando-se ainda mais difícil identificá-las; evoluindo inclusive para ataques cibernéticos. E, por esse motivo, a fraude nos alimentos sempre irá existir e nunca será totalmente eliminada. 

Produtos ilegítimos, quando descobertos, causam desconfiança no consumidor e deixa vulnerável toda a cadeia e indústria de alimentos, prejudicando não só os consumidores, como os profissionais, empresas e o mercado de alimentos em todo o mundo.

Diante disso, as punições são severas para os profissionais que adulteram a autenticidade dos produtos, indo desde prisões à suspensão do direito de atuar em sua área de formação. 

Fique atento! Se existe fraude em sua empresa, mesmo que você não seja o responsável, não participe, ser conivente com esse ato também é crime!

Cabe, então, aos órgãos competentes, auditores e fiscalizadores, tomarem medidas que visam reduzir as oportunidades para os fraudadores, melhorando, assim, os sistemas de detecção.

Porém, como a realidade desse cenário é explicada a partir da existência de consumidores dispostos à compra, presença de um fraudador e ausência de um controle rigoroso, mudar esse quadro não é só obrigação apenas dos fiscalizadores. Também cabe a todos os colaboradores, profissionais e responsáveis pela cadeia alimentícia, evitar fraudes e ter ética no trabalho, prezando sempre pela qualidade e segurança dos alimentos em todo o processo de produção.

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Autoria do redator do Ifope:
Mariana Pereira Santos